29.12.06

A boa e velha felicidade

Nesta semana do ano, todas as coisas e cochichos giram entorno do tão esperado dia 31. Só se fala nisso. Todos planejam a roupa que vestirão, mulheres correm para os cabeleireiros, uns fazem resoluções para o ano que chega, outros dão nota para o que vai. É um corre-corre para cumprir prazos, ir a festas de fim de ano, participar de amigos-ocultos, dar beijo de ano-novo em fulano, abraço em cicrano, trocar os presentes e por aí vai.

É cansativo, muito mais cansativo do que o Natal, porque gera mais expectativa e mais tensão. Enquanto o Natal é uma festa associada à família, à união, à celebração - tão pouco feita - dos valores pregados por Cristo, o Réveillon é invariavelmente associado à farra, à festa, a aproveitar ao máximo os primeiros momentos do ano, como se não tivéssemos um ano inteiro para viver. A programação intensa que o Rio sempre promove mostra isso. Shows e mais shows, rios de dinheiro gastos para entreter a todos e saudar o novo ano com uma festa inesquecível. Ora, com o dinheiro gasto para trazer Black Eyed Peas e Infected Mushroom para Ipanema na hora da virada, poderíamos fazer mil shows ao longo do ano, para um público muito maior do que o que será beneficiado. Eu sei, eu sei, há o turismo envolvido, a importância de renovar a esperança de todos, e tudo mais. Mas, acredite, há também esse lado da necessidade de fazer todos aproveitarem ao máximo os primeiros instantes do ano. Isso acontece no mundo inteiro, não é mais uma exclusividade carioca, como o Cristo ou o Bondinho. É fruto da cultura imediatista em que vivemos. Por causa dela, a forma como passamos a meia-noite determina o desenrolar dos outros 365 dias do ano, ou seja, devemos fazer aquele primeiro momento ser magnífico para que o resto do ano também seja. Com todo esse peso que colocamos sobre o pobre dia 31, não é à toa que o fim de ano é tão cansativo, tão estafante.

No entanto, e agora essas linhas ganham sentido, acredito que este ano devemos mais do que nunca aproveitar com a maior intensidade possível esses primeiros segundos de 2007. É importante mostrarmos a este estado de coisas que estamos vivendo nos últimos dias aqui no Rio, a essa violência absurda, que estamos vivos. Mostrar que somos nós mesmos que mandamos nas nossas felicidades. Dizer que não vamos deixar que tiros e ações terroristas tirem o nosso direito de sermos felizes. O nosso direito de ir e vir, de sair e voltar. O direito negado hoje ao policial morto que comemoraria mais tarde o aniversário de sete anos da filha. Não vamos deixar que boatos e traficantes consigam tirar o nosso sono, nem estragar a maior festa da nossa cidade. Vida normal, gente, ou melhor, vida mais feliz. Vamos cantar, gritar, pular, dançar, amar, beijar, transar, chorar de felicidade, quebrar a cara se preciso for. Vamos fazer tudo para mostrar que não existe nada mais subversivo a esse estado de coisas do que a felicidade. A boa e velha felicidade.

13.12.06

Vou fingir que não ouvi

Espero que as palavras do Lula ao receber o prêmio de brasileiro do ano pela Istoé não reflitam o que o presidente realmente pensa. Seria decepcionante constatar que uma das pessoas que mais admiro pensa dessa forma. Dizer que ser de esquerda é ter problemas é o mesmo discurso usado contra toda a esquerda ao longo do século XX. Basta lembrarmos do discurso anti-comunista de que "a esquerda era doente mental".

Fiquei triste, realmente triste com essas palavras do Lula. Espero que seu segundo governo, pelo qual me empenhei - e muito - para que acontecesse, não traduza o que ele disse na última segunda. Bom, se lembrarmos de muita coisa que ele disse antes da eleição de 2002 e que não pôs em prática no atual mandato, veremos que isso não tem muita chance de acontecer.

De qualquer forma, agora, mais do que nunca, mais do que quando os escândalos de corrupção explodiram, mais do que se descobrissem dinheiro dentro da calcinha da Dona marisa, estou com um pé atrás com o Lula. E repito: triste, muito triste. Deus queira que esse tenha sido mais um discurso de platéia, ou seja, feito apenas para agradar a platéia de Antônios Ermírios e Gerdaus que compunham o auditório da Istoé. Que o verdadeiro Lula, o Lula em sua essência, seja o que discursa em palanque, o que fala coisas às vezes com um quê de exagero, mas coerentes com a sua biografia e consoante com os anseios do povo que o reelegeu.

11.12.06

Apesar do Gladiador Boy, assistam

Assisti no final de semana ao novo filme de Russell Crowe, a comédia romântica Um bom ano. Antes de qualquer coisa, vou deixar claro que não simpatizo com Crowe. Sei que ele é um bom ator, mas tenho minhas cismas. Implicância mesmo, pois sempre que vejo uma entrevista o acho arrogante e pretensioso. Mas, para minha alegria, nesse filme, ele está realmente mal. Canastrão, não sabe fazer comédia, não sabe mexer o corpo direito, fica desengonçado, perdido, cheio de caretas, nem perto do excelente ator de Uma mente Brilhante, de 2001. Agora, como o craque do mercado financeiro Max Skinner, Crowe vai mal, muito mal. Posso dizer que ele estraga o filme e deixa que os coadjuvantes roubem a cena.

Quem também rouba a cena é a região em que o filme se passa, a Provence, no sul da França, com as vinícolas e aquele clima afrancesado. É fantasticamente bonito. Simples, rústico, bucólico e francês. Très français. E as mulheres francesas? Lindas, com corpos maravilhosos e, lembrando que isso é cinema e não realidade, limpas... No meio disso tudo, eu louco para nunca acabarem as cenas com presença feminina, tinha que aturar o Crowe. Grrrr. Que raiva. Mas tudo bem. O filme vale pela trilha também. Muito bom, misturando temas franceses e americanos na dose certa.

Na dose certa estão também as já clichês trocas de farpas entre americanos, franceses e ingleses. Eles trocarem farpas é comum, mas nesse filme elas são originais e não ficam só naquele ramerrame de um criticando a culinária do outro. Isso tem também, mas falam da burrice americana, uma quase unanimidade mundo afora. E no meio desses diálogos legais, dos excelentes coadjuvantes e da bela paisagem, está Russell Crowe e seu ar pedante. Grrrr. Tudo bem, tudo bem. Ainda assim recomendo o filme. Bom programa. Apesar do Gladiador Boy.