15.5.09

É nóis na Flip

Depois de chorar copiosamente durante a Festa Literária de Paraty do ano passado, é com orgulho que o Textos etc comunica a seus ínclitos leitores que fará a cobertura completa da Flip 2009. Sim, meus caros. Vocês leram bem. Este modesto blog que há mais de ano faz ponto na porta da esquina, qual moça arrependida da vida pregressa, estará lado a lado de nomes como Chico Buarque, Gay Talese, Milton Hatoum, Sérgio Rodrigues (autor do ótimo Todoprosa), Lobo Antunes, Arnaldo Bloch, Cristóvão Tezza e Manuel Bandeira.

Peralá! Bandeira? Ok, foi retórica introdutória para fisgar o leitor. Bandeira será apenas o autor homenageado deste ano. Um dos grandes especialistas no poeta, Edson Nery da Fonseca dividirá a mesa com Zuenir Ventura, que foi seu aluno. Papo que deve render muito. Ofuscada pelo centenário de morte de Machado de Assis, a efeméride de quarenta anos da morte do autor de Libertinagem não foi tão badalada ano passado. Este ano, a Flip tenta colocá-lo novamente no centro da mesa. Ainda no conjunto de atividades para homenageá-lo, haverá uma oficina de poesia com o escritor e tradutor Paulo Henriques Britto, professor da PUC-Rio e autor do premiado Macau.

Gênio do jornalismo literário, Gay Talese, estrela maior desta edição da Flip, será entrevistado por ninguém mais, ninguém menos que Mario Sergio Conti, autor do delicioso Notícias do Planato, que só agora estou lendo, 10 anos depois de lançado. Hoje Conti integra a equipe da revista Piauí.

Dois festejados romancistas brasileiros só revelados nos estertores do século XX estarão juntos falando sobre a relação de suas obras com a cultura brasileira. Na mesa que promete ser das mais concorridas do evento, Chico Buarque e Milton Hatoum estarão pela primeira vez juntos - pelo menos em público. Depois de Budapeste, Chico lançou este ano Leite derramado, livro delicioso e que tem forte viés de interpretação do Brasil. Já a obra de Hatoum vêm contando a saga do Norte brasileiro, tão pouco explorado na literatura. Seu Cinzas do Norte é lindo.

Outro destaque deverá ser a mesa composta por Sérgio Rodrigues, Arnaldo Bloch e Tatiana Salem-Levy, autores de Elza, a garota, Os irmãos Karamabloch e A chave de casa, respectivamente. Devido ao meu grande interesse em biografias, essa mesa, que vai discutir a relação entre biografia, romance e memorialismo, terá em mim um atento espectador. Estou terminando de ler os livros de Bloch e Rodrigues e admito que é impressionante a mistura que ambos fazem desses três elementos para contar duas histórias verdadeiras. Arnaldo narra a saga de sua família (desde a vinda da Ucrânia até a falência do grupo que tinha como principal empresa a Rede Manchete). Já Sérgio recria em romance a história de uma jovem comunista assassinada pelo Partidão, escapando como Arnaldo da fórmula de biografias que reina no Brasil.

Via Twitter (www.twitter.com/textosetc) e por este presente blog, o Textos etc tentará estar presente no maior número possível de mesas literárias. Também falarei sobre curiosidades de Paraty e sobre o clima da Festa, que aguarda de 20 a 30 mil pessoas andando sobre as seculares calçadas da cidade.

Dica para quem deseja ir à Flip: no bonito site da Festa, há a programação completa.

Dica 2 para quem deseja ir à Flip: fechei há duas semanas meu hotel. Ainda há vagas. Faça uma busca na internet que você ainda consegue ir sem doer muito no bolso.

12.5.09

Gol contra de Rrrrrrrrrrronaldinho

Hoje, Daniel Castro, colunista de TV da Folha, contou com exclusividade em sua coluna que Ronaldo Fenômeno (sim, aquele que a TV Globo quase coloca no colo e faz cafuné) assinou contrato de publicidade com... o SBT. Segundo a nota, a decisão do mais novo garoto propaganda do Baú do Silvio não agradou à emissora. Pudera.

Desde o início da crise atravessada por Ronaldinho (não consigo chamá-lo por Ronaldo, por mais que me esforce), a Globo foi uma mãe para o garoto que Galvão Bueno tanto enalteceu ao longo dos anos 90 e do início dos anos 2000. Intimou a apresentadora do Fantástico Patrícia Poeta a entrevistá-lo para que ele esclarecesse detalhes do arroubo romântico que o levou a dar uma carona para André(ia) Albertini ano passado, tem dado destaque de vitória de Copa a cada gol que ele vem marcando no Corinthians e, agora que voltaram a tratá-lo como o Pelé dos novos tempos, a Globo dispensou a ele um tratamento pra lá de vip.

Quanta ingratidão, Ronaldinho! A emissora não merecia isso. Tantas foram as vezes que deixou de enxergar como eram grandes as celulites de sua fenomenal barriga, tantos foram os momentos que as positivas cenas filmadas pelas câmeras globais fizeram parecer que ele era o grande jogador de outrora. Que vergonha! Talvez agora as celulites apareçam, os gols sumam e o Ronaldo 2009 surja, gordo, estabanado e decadente.

Brincadeiras à parte, é claro que a emissora continuará a mostrar os momentos positivos de Ronaldinho. Mas é claro que ele sairá perdendo. Associar sua volta por cima pessoal à volta por cima que o SBT há tempos tenta dar é uma boa estratégia para o SBT, mas não para ele. É um dinheiro que não vai torná-lo mais rico e tampouco agregará mais valor à sua imagem. E boa imagem, vamos combinar, é o que um jogador como ele mais precisa na fase final da carreira.

10.5.09

Catarse no Dia das Mães

Ano passado, por conta do Dia das Mães, fiz um podcast, o primeiro do Textos etc, sobre a música Mrs. Robinson, tema do filme A primeira noite de um homem. Este ano, a ideia do post deste domingo veio graças ao acaso. Comprei na sexta o DVD do meu filme favorito, Sonata de Outono, do Ingmar Bergman. Sonho antigo, eu bestamente não o concretizava. Ontem, aproveitei um súbito impulso consumista – cada vez mais comum, infelizmente – e paguei 50 reais pelo filme.

Há muito falava com minha mãe sobre o filme, como faço, aliás, sempre que posso. Divulgar a existência de Sonata de Outono é amenizar a ira divina e facilitar a entrada no céu. Aproveitei o gancho do Dia das Mães e a presenteei com o filme. Atitude cretina, já que é claro que ela sabe que eu, na verdade, o comprei para mim. Mas tudo bem. Ser mãe é perdoar esse tipo de canalhice.

Ontem, eu, ela e minha irmã o assistimos juntos, coisa que fazemos cada dia menos, derrotados que somos, cada dia mais, por nossos compromissos individuais. Filme estranho de se ver com mãe. Quem já viu o filme sabe do que falo.

Sonata de Outono é a mais genial representação do potencial emotivo que existe na relação entre mãe e filha. É impressionante como, tanto no cinema, com Ingrid Bergman no papel da mãe Charlotte e Liv Ullmann no da filha Eva, quanto no teatro, com Marieta Severo no papel de Charlotte e Andréa Beltrão no de Eva, o texto de Bergman – que também era dramaturgo – é bem-sucedido no mergulho que faz, por meio de uma forte carga dramática e habilidosa sondagem psicológica, na alma torturada de uma filha tão carente do primeiro e mais importante – e também mais forte – amor que recebemos na vida.

O clímax do texto pode ser sintetizado pela seguinte fala de Eva, numa cena de close típica do diretor sueco, com Liv Ullmann em segundo plano, falando, e Ingrid no primeiro, ouvindo o monólogo da filha, meio em tom de desabafo, meio em tom de punhalada:

- Mãe e filha. Que mistura terrível de sentimentos, confusão e destruição. Tudo é possível e tudo se faz por amor e preocupação. As cicatrizes da mãe são passadas para a filha. As falhas da mãe são pagas pela filha. A infelicidade da mãe é a infelicidade da filha. Parece que o cordão umbilical nunca foi cortado. É isso? É isso? Será que a infelicidade da filha é o triunfo da mãe? Mamãe, será que a minha tristeza é a sua satisfação secreta?

No cinema, o papel da mãe que abandonou as duas filhas para tocar a carreira de pianista é uma interpretação impecável de Ingrid Bergman, cuja vida pessoal certamente deve ter contribuído para que ela alcançasse o tom da personagem. Como Charlotte, que na história teria sido uma mulher infiel e uma mãe extremamente ausente, Ingrid deixou o marido e a filha pequena para ir viver com Roberto Rossellini.

Disse que é um filme estranho de se assistir com mães porque é claro que todas se comparam com Charlotte. Devem fazer freudianos questionamentos do tipo “Fui realmente uma boa mãe?”, “Será que fiz isso com os meus?”, “Também os abandonei, como Charlotte?”

Aqui em casa, é um filme que pode ser visto a qualquer dia, até porque minha mãe foi o oposto da personagem escrita por Bergman – e isso não é papo de Dia das Mães. Mas, sejamos francos, não é filme a que todos possam assistir num dia como hoje, em que a família se reúne e é altíssima a chance de, como no Natal, voar rabanada. A catarse pode esperar um dia mais light.

Se bem que, quem sabe, dependendo do grau de dificuldade da sua relação com sua mãe, o filme até pode ajudá-los a resolver antigas mágoas. Nunca é tarde para se reaproximar de quem, pelo ódio ou pelo amor, é fundamental nas nossas vidas.

6.5.09

50 anos do mais mítico dos discos de jazz

Em março passado, fez 50 anos da gravação do mais clássico disco de jazz, o mítico Kind of Blues, de Miles Davis e mais cinco outros importantes homens de jazz: Cannonball Adderley, John Coltrane, Paul Chambers, Bill Evans e Jimmy Cobb, o único ainda vivo. Cobb foi entrevistado pelo jornalista Jotabê Medeiros, no Estadão. Como entendo bem menos de música do que gostaria, me aproprio de um trecho da matéria publicada ontem pelo Jotabê:

Nos 55 minutos e 16 segundos de Kind of Blue, nada está fora do lugar. Cada elemento, a introdução do baixo em em So What, o solo de Coltrane em Blue in Green. Até a ordem das músicas é perfeita. Cabe ali a sentença de conter pelo menos três baladas impecáveis: Blue in Green, All Blues e So What. E músicas de uma vibração incomparável, como Freddie Freeloader e Flamenco Sketches

Pensando em quem não conhece o álbum, o Textos etc, sempre assistencialista para com seus leitores, preparou um iPod com as músicas. É só dar play abaixo e ouvir. Se gostar, quebre o porquinho e compre a edição especial que a Sony-BMG acaba de lançar com dois CDs (as cinco faixas originais + sobras de estúdio) e um DVD (com o filme Celebrating a Masterpiece e a gravação de um show para a emissora CBS, em 1959). Quem quiser gastar um pouco mais poderá ir ao Bridgestone Music Festival, no Citibank Hall de São Paulo, em que Jimmy Cobb estará presente.

5.5.09

Lacunas do caso Rubem Paiva

O Estadão publicou hoje três matérias sobre o caso do desaparecimento do ex-deputado Rubens Paiva, durante a ditadura militar. Sempre tive curiosidade de saber mais sobre a história, em detalhes, desde que li o gostoso livro Feliz Ano Velho, escrito por seu filho, o jornalista Marcelo Rubens Paiva, em 1982. São muitas as lacunas que precisam ser preenchidas na história, incluindo aí a verdade final sobre o que lhe aconteceu depois que foi preso.

Num primeiro momento, o governo militar chegou a negar até a prisão dele. Depois, irritado pela insistência na busca por Rubens Paiva, o Exército preocupou-se em criar uma versão, tida como farsesca pela família, de que ele teria sido resgatado por guerrilheiros. A família tem informações de que, após a prisão do deputado em 20 de janeiro de 1971, no Leblon, ele foi levado para a III Zona Aérea e torturado. De lá, foi transferido para o DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações-Centro de Operações de Defesa Interna), onde, novamente torturado, não resistiu e morreu.

As três matérias estão disponíveis na íntegra no site do jornal e valem ser lidas. São exemplos perfeitos de como é importante a abertura dos arquivos da ditadura militar para ajudar na elucidação de casos como esse.

Lacunas marcam laudo oficial sobre Rubens Paiva
Documento derrubou versão inicial dos militares
Procura por ex-deputado irritou Exército