No momento em que a guerra de versões entre a ministra Dilma e a ex-secretária da Receita Lina Vieira está no auge, nada melhor do que o cinema para acenar com a bandeira branca da paz. Mas como nem só de blockbuster se vive, é a um autêntico Kurosawa, para alguns o mais ocidental dos cineastas japoneses, que recorro para jogar luz sobre o conflito de relatos que ora vivemos na política e principalmente na mídia.
Rashomon (Japão, 1950), considerado por muita gente boa a obra-prima de Akira Kurosawa, é um filme que não discute de forma direta o jornalismo, mas é perfeito para discutirmos como a atividade é uma guerra de versões, um conflito de várias "verdades". Ele destrincha o estupro de uma mulher e o aparente assassinato de seu marido através dos relatos de quatro testemunhas, incluindo o estuprador e, por meio de um médium, o marido morto. As versões são contraditórias, deixando o espectador escolher qual é a verdadeira.
São, portanto, quatro histórias diferentes e excludentes. Se a história do estuprador for verdadeira, a da mulher não é, a de seu marido tampouco e a de um lenhador que passava pelo local idem. Quem começa a narrativa é o lenhador, que também é o primeiro a admitir que é mentira o que contara. Ele confirma a versão de um dos outros três - assista ao filme para saber de quem - sem, no entanto, convencer o espectador sobre a verdade daquilo. Afinal, quem mente uma vez perde a credibilidade sempre.
A discussão sobre o que é verdade - se é que ela existe - é o que faz de "Rashomon" um filme importante para jornalistas. Às vezes, para não dizer quase sempre, nos deparamos com uma guerra de relatos. Invariavelmente, escolhemos um deles. A escolha foi certa? Não sei. Existe uma escolha certa? Não sei.
20.8.09
Kurosawa e as versões de Dilma e Lina
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Cinema,
Jornalismo
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