29.12.08

Yes! Nós temos a Cidade da Música

Nunca impliquei com a Cidade da Música, obra faraônica iniciada em 2003 pelo prefeito Cesar Maia, embora entenda os argumentos de quem acha um desatino gastar quase R$ 600 milhões numa cidade tão carente de serviços públicos de qualidade. Mas, ainda assim, acho válido o investimento, visto que dificilmente, num governo com o perfil do que agora se encerra aqui na cidade do Rio, esses recursos teriam destino diferente, como a construção de hospitais, escolas ou melhorias urbanas significativas. Provavelmente seria destinado a outra pirotecnia do alcaide, como obeliscos de gosto duvidoso - como o que corta a Rua Visconde Pirajá, em Ipanema.

O projeto da Cidade da Música é muito interessante. Cesar Maia encomendou-o ao arquiteto francês Christian de Portzamparc, que já recebeu vários prêmios, entre eles o Pritzker, considerado o Nobel da arquitetura. É especializado em projetos de grande porte urbano, como grandes equipamentos culturais, sendo responsável pela criação de salas de música em grandes capitais da Europa, inclusive a Cité de la Musique, de Paris.

O local abriga um complexo com a maior sala de concertos de orquestras sinfônicas e óperas da América Latina. É também, por suas características técnicas, única no mundo. A Cidade da Música foi erguida em uma área de 94 mil metros quadrados, com duas salas de concerto: uma tem capacidade para 1.800 lugares e outra para 800 lugares. Além de salas para concertos e estudos, com atividades de incentivo a novos talentos, formação de platéias e cursos diversos, servirá de sede à Orquestra Sinfônica Brasileira, que ali desenvolverá uma escola de música e um projeto de formação para novos músicos e ouvintes. Ou seja: é algo que o Rio precisava há séculos.

Outro lado positivo é que foi construída em um ponto da cidade extremamente carente de equipamentos de cultura erudita, a Barra da Tijuca, meca do consumo e da cultura de massa. Bem perto dali há uma enorme réplica da Estátua da Liberdade de Nova York, uma da Torre Eiffel e outra da Torre de Piza. Com a Cidade da Música, o bairro muda seu perfil de subserviência cultural e poderá oferecer, além dos shoppings e praias, opções culturais bem mais enriquecedoras aos milhares de moradores de toda a cidade - das partes mais pobres, inclusive - que para lá se bandeiam todo fim de semana.

Como ainda não fui lá, aproveito-me da opinião de gente até mais abalizada, que já foi e entende realmente de música: o crítico musical e agora imortal da Academia Brasileira e Letras Luiz Paulo Horta. Hoje ele publicou um artigo no Globo em que conta como a classe musical está eufórica com a novidade. Parabéns a Cesar Maia, que, embora tenha sido péssimo governante, merece o crédito por esse presente à cidade. Obrigado.

Veja trecho do artigo do Luiz Paulo Horta:

"Por cima e em volta de você, um projeto arquitetônico que é enorme, mas surpreendentemente leve, talvez porque não haja ou não se percebam linhas retas. A impressão é que você está no meio de um vendaval imóvel com os planos sinuosos de concreto, que parecem velas. (...) Faltava conferir a acústica. (...) O som corria bem, e nesse banho de música a sala podia considerar-se definitivamente inaugurada. A classe musical no final estava entre eufórica e estupefata.”

2 comentários:

Anônimo disse...

Olá Gui, tudo bem?
Como foi o Natal? Espero que tudo bem!
Bom, fiquei feliz pela Cidade da Música. Por ser uma grande admiradora da música clássica, acredito que a Cidade contribuirá muito para a cultura erudita dos cariocas, que cá para nós, tem tido o ouvido castigado ultimamente com gêneros musicais um pouco esdrúxulos. Porém fico feliz com ressalvas. Gui, fico a pensar porque um projeto desses não pode ser considerado na Zona Norte da cidade ou ainda, por que não, na Baixada Fluminense. Posso estar sendo um tanto maniqueísta, mas Barra da Tijuca me lembra poder aquisitivo, o que me lembra também do passado, quando a música clássica também era realizada e ouvida pela elite burguesa. Será que é tão louco assim associar a área com menos poder aquisitivo à música clássica? Quando houve um concerto de música clássica na Praça dos Três Poderes, em frente à prefeitura de São João de Meriti há 10 anos atrás, a praça lotou. Tinha gente sentada até nas árvores para ouvir o concerto.
Em Ramos há o Piscinão e a Concha Acústica. Imagino se algum dia a Orquestra Sinfônica Brasileira irá fazer um grande concerto lá para agraciar os ouvidos da plebe... Ou será que é sonhar demais?
Gui, meu querido amigo filé, feliz 2009 para você, para a sua mãe e para a sua irmã!
Um grande beijo,
Verônica Ferreira.

Guilherme Amado disse...

Vero, acho que a Barra foi uma boa escolha, embora entenda sua reivindicação. No mundo ideal, poderíamos ter uma Cidade da Música lá também, mas o fato é que o Rio precisa formar platéia e a Barra é um bairro central para isso. Todo fim de semana, é invadida por pessoas da Zona Norte, da Baixada, e das partes mais pobres da Zona Oeste, sem discriminação.

Na praia da Barra, tem favelado, suburbano, patricinhas e playboys. No Barrashopping, idem. Acho difícil imaginar, por uma questão de preconceito, que a "parte rica" da cidade fosse à Baixada ou à Zona Norte para ouvir música clássica, mas o inverso é provável. Até porque, admitamos, existe um fascínio - totalmente explicável sociologicamente - desse "Rio pobre" por esse "Rio rico".

Enfim... Posso estar sendo precipitado nessa minha avaliação, mas acho que foi bem escolhido o lugar.

Beijos e excelente ano novo para você e sua família!