19.4.09

O céu dos nossos cachorros - parte I

A ideia para essas linhas chegou há umas semanas, acompanhada da intuição de que em breve minha cachorra, a dog alemão Sasha, estava para subir. Mais de um metro de altura, provavelmente uns 60 e tantos quilos, toda preta, peito e patas brancas, a Sashinha se mudou ontem de manhã para a minha lembrança. E, posso dizer sem titubear, lá estará para sempre – ou até a senilidade vir e, imperiosa, roubar também minhas memórias caninas. Sempre tive cachorros, com ênfase no plural. Já chegamos a ter seis de uma só vez. O Scooby (nós a chamávamos assim, já que era da mesma raça do personagem do desenho), pelos quase dez anos que nos protegeu, com seu porte de guarda, seu latido intimidador, sua postura de ataque, entrou no seleto hall dos cães inesquecíveis da minha casa.

O primeiro a participar desse grupo foi o Oscar, beagle que minha mãe e meu pai compraram em 1980, dois anos depois de se casarem. Nunca conheci um canino que tenha vivido mais que o Cazinho (todos nossos cães recebem nome e, de lambuja, alguns apelidos. Durou, acho que não por acaso, quase o mesmo tempo do casamento dos meus pais. Morreu aos 17, em 1997; o casamento faleceu pouco antes, em 1996.

Na mesma época dele, marcou sua pata na calçada da memória a terna e eterna Baal, a primeira pastora alemã que nos protegeu, acompanhou e deu amor. A segunda, espécie de reencarnação da fidelidade da Baal, foi a Bonnie, dona de um olhar dócil e compreensivo que só as mães têm. Apesar de nunca ter tido filhotes, ela foi mãe de várias gerações que por aqui passaram. Ajudou a criá-los, mesmo que não fossem pastores como ela, mostrando como deviam se comportar, a que ordens obedecer, como brincar. Com a gente, ela acompanhou barras pra lá de pesadas. Lembro, pequeno, de abraçá-la na busca do conforto que só os amigos dão. Certamente cônscia da sua importância, não se entregou à velhice e resistiu o quanto pôde à morte. Cega, vítima de sucessivos derrames, sem andar, a decisão de sacrificá-la foi dolorosa, mas necessária.

Duas das educadas pela Boninha foram as labradoras Brida e Larissa. Do tipo amarelo, tinham diferentes os focinhos e os olhos. A primeira tinha fuço marrom e olhos verdes, a segunda era mais tradicional e sempre ostentava sua pureza de raça com os olhos escuros e o nariz preto. Ambas morreram precocemente, antes de completar três anos, deixando vazio o espaço de alegria que os labradores preenchem tão bem.

No território dos machos, além do Oscar, reinou o Sutter. Meio pastor alemão, meio vira-lata brasileiro, tinha a personalidade mais curiosa que por aqui já latiu. Quando jovem, gostava de murar a hera numa coreografia que parecia combinada com o cachorro do vizinho. Cada um do seu lado, os dois iam e voltavam, latindo, estranhando-se, tentando marcar o terreno já divido pelos seus donos e pelo concreto. Mais velhinho, tornou-se mais reservado e dava confiança para poucos.

Continua no próximo post

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