24.6.09

Relíquias: O Hamlet de Aderbal

Que me desculpem os críticos, mas o Hamlet de Aderbal Freire-Filho é fundamental. Assiste semana passada à peça, aproveitando a última chance aqui no Rio, já que a produção agora irá rodar o Brasil (parece que o roteiro inclui Curitiba, Campinas, Santos, Salvador e Recife, mas essa não é uma informação oficial). Achei a montagem de Aderbal muito bem feita, pois conseguiu tornar o texto contemporâneo e, ao mesmo tempo, manter sua consistência. O elenco, encabeçado por Wagner Moura, Tonico Pereira e Carla Ribas - protagonista do filme A casa de Alice - dá conta do recado e vai além.

Está certo que Moura está um tanto acima do tom como o atormentado príncipe que recebe do espírito do pai a missão de vingar sua morte. Mas e daí? Sua interpretação excitada é muito prazerosa de ver. Como bem frisou a crítica Barbara Heliodora, do Globo (link para a crítica de Barbara no fim deste post), a tradução optou por não seguir a oscilação presente no texto original entre o Hamlet louco, quando o personagem fala em prosa, e o racional, quando o texto está em poesia. O Hamlet de Moura é louco praticamente o tempo todo.

E isso é maravilhoso, pois dá nuances ainda mais dramáticas à conhecida e eterna discussão do "ser ou não ser" que a peça propõe. O que é verdade e o que é representação? Não estamos o tempo todo representando? O teatro, como arte-espelho da natureza humana, é o objeto central da peça. Já havia lido, mas nunca assistido a uma encenação deste que é um dos textos fundamentais de Shakespeare. Essa percepção de que "Hamlet" coloca em discussão o próprio teatro só consegui ter assistindo à peça.

Aí que entra a importância dos outros elementos cênicos que tornam o teatro uma arte tão sensorialmente rica. A iluminação de Maneco Quinderé responde a quem se pergunta por que é tão grande seu prestígio no teatro carioca. Rodrigo Amarante criou uma música bonita em muitas partes. O figurino mistura elementos de época com trajes contemporâneos, dando um ar atemporal às roupas dos personagens, sendo destaque absoluto uma armadura usada pelo fantasma do pai de Hamlet. Curiosidade: pesa 16kg.

Já o prazer depois de assistir à montagem de Aderbal pesa bem mais. Não sei quanto até agora, mas é muito.

No YouTube, achei algumas cenas selecionadas. Quem mora nas cidades por que a peça passar não pode deixar de ver. O preço é meio alto, mas vale cada centavo.



Tanque de links:
Críticas de Macksen Luiz, Rodrigo de Almeida, Daniel Schenker e Eliana Pibernat Antonini no Jornal do Brasil
Shakespeare cai ferido no Leblon: a crítica de Barbara Heliodora no Globo
Carta de Aderbal Freire-Filho à crítica de Barbara
Réplica de Barbara à resposta de Aderbal
Piruetas de um príncipe acrobático: a crítica de Jefferson Del Rios no Estadão
Moura faz o Hamlet de sua geração: a crítica de Sérgio Salvia Coelho na Folha
Site do figurinista Marcelo Pies mostra todas as roupas criadas e explica uma a uma

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