11.9.09

Sangue e beleza na estreia do Café Literário da Bienal*

Sangue, violência e um quê de perversão são os ingredientes que formam na literatura o conceito de abjeto, mas que podem também refletir uma beleza própria, revelada em outras camadas do texto ou pela articulação desses elementos. Para discutir a ponte entre esses dois polos, o belo e a abjeção, os escritores Lourenço Mutarelli (ao fundo, na foto de André Coelho, do Globo), André Sant’Anna (no primeiro plano) e Ana Paula Maia se reuniram nesta quinta-feira, sob mediação da jornalista Rachel Bertol, no primeiro encontro do Café Literário, espaço da Bienal do Livro que reúne escritores, críticos e personalidades das Letras.

Conhecidos por essa estética do nojo, os três tentaram chegar a uma explicação do que seria essa linguagem, embora reconheçam que ela é consequência natural do trabalho criativo:

- Tenho atração pelo abjeto, dediquei minha existência a olhar e entender o abjeto. Mas o estilo, no meu caso, é muito mais uma deficiência. Eu não faço como quero, faço como posso – arriscou Mutarelli, cujo filme baseado em seu romance “O natimorto” participará da Première Brasil, no Festival do Rio de 2009.

Para André Sant’Anna, que lançou recentemente “Inverdades”, livro de contos em que os personagens são celebridades como Sandy, Lula, Ronaldo, Nelson Rodrigues e Roberto Justus, entre outras, o tema da abjeção é reflexo de sua relação com o mundo:

- É punk devolver para o mundo o nojo que ele me causa. Eu não escrevo para chocar as pessoas. Escrevo para mostrar o quanto eu estou chocado com o fato de ninguém respeitar uma faixa de pedestres, escrevo por 90% do parlamento brasileiro ser formado por bandidos

Ana Paula Maia, autora de “Entre rinhas de cachorros e porcos abatidos”, citou o protagonista de seu livro, o abatedor de porcos Edgar Wilson, para explicar sua crença de que o trabalho influi de alguma forma no caráter da pessoa, na sua visão de mundo.

- Ele precisa ter uma frieza para abater porcos. Ele mora num lugar ermo, abafado, afastado de tudo, e se diverte numa rinha de cachorros que frequenta uma vez por semana.

O livro mostra um Edgar que, apesar de viver nesse ambiente conflituoso, enxerga a vida de forma positiva. É um homem que gosta de contemplar o céu, por exemplo. Ana Paula avalia que o belo, ponto oposto ao conceito de abjeto, está presente em outra camada de sua obra, nas várias subtramas que se entrelaçam à história principal.

- A minha literatura está muito permeada de violência, mas também de bons sentimentos, como a lealdade, a fidelidade, o companheirismo.

* Texto publicado originalmente no site do Globo.

Um comentário:

Rui disse...

"É punk devolver para o mundo o nojo que ele me causa. Eu não escrevo para chocar as pessoas. Escrevo para mostrar o quanto eu estou chocado com o fato de ninguém respeitar uma faixa de pedestres, escrevo por 90% do parlamento brasileiro ser formado por bandidos"

Demais!!!